Ter ou ser? Eis a questão!

      Quando surge a tal pergunta se quem veio primeiro foi o ovo ou a galinha, às vezes acredito ser o ovo, depois a galinha... E o que vem primeiro: o ser ou o ter? A filosofia tenta explicar cada um, porém, é a prática social quem nos ensina.

      O ser ou o ter: eis a questão! O ser é o estado de existir, fazer parte da sociedade em que se vive. Em uma das concepções do ser, pelo filósofo alemão Heidegger, no desenvolvimento da existência: o ser humano estabelece relações com o mundo (ambiente natural e social historicamente situado). Para existir, o homem projeta sua vida e procura agir no campo de suas possibilidades. Assim, move uma busca permanente para realizar aquilo que ainda não é. Em outras palavras, existir é construir um projeto. O ser é um processo interno que se adquire com o convívio, com o conhecimento e experiências; o ter é algo externo.

      Quando se tem sem possuir a experiência do ser no mais amplo aspecto e o ter se sobressai, podemos correr o risco de querer comprar tudo, inclusive as pessoas que nos circundam.

      Ao estudarmos as Leis de Diretrizes e Bases da Educação, verificamos que essa tem de despertar o “aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver e aprender a ser”. Portanto, a educação nos ensina a ser, ou seja, promove o indivíduo ao estado amplo de humanidade: crítico, consciente, desalienado socialmente, que se pratica a cidadania, etc.

     Porém, vimos que a sociedade foca o olhar no ter, dificilmente vemos punidos quem têm poder e dinheiro quando infringem a lei ou cometem crimes graves, é só verificarmos por onde anda os condenados do mensalão, por exemplo. Temos a impressão que as leis só se aplicam aos menos favorecidos, daí a inversão de valores: o ter se sobressai e o ser é esmagado por um sistema do quem pode mais, ou melhor, quem paga mais.

    Nesses manifestos, muitos gritam por educação. Mais escolas, apenas, não resolve o problema da educação. Um reajuste no sistema sim. No período de ditadura militar, a escola perdeu muito. Não se podia questionar nada. As disciplinas eram aplicadas como regras, não havia assimilação, ou seja, era um ensino mecânico, não se aplicava no dia a dia.

    Talvez ainda seguimos esse modelo errôneo de ensino; estudamos as disciplinas apenas, mas não aplicamos na vida, não fomos, muitas vezes, estimulados a isso.

    Podemos observar isso nas religiões também. Pregam o amor, a doação e nada parece ser posto em prática, só se é cristão, por exemplo, dentro dos templos.

    Todo conteúdo, em qualquer área, se não assimilado, se não for internalizado, de nada será válido. Os ensinamentos incorporam o ser; sem o ensino enraizado não há cultura, conhecimento. E ficamos abertos apenas ao que nos é apresentado por essa cultura midiática extremamente capitalista. E não discernimos, seguimos a onda. E essa onda do ter que tanto nos é pregada, massacrará o ser. E não nos espanta tantos indivíduos de classes inferiores mascararem o seu real estado financeiro e portarem-se com atos de superioridade, como que ser superior é ter algo, ou simplesmente, mostrar ter. Buscar pela sabedoria é algo que vem se acabando, já não questionamos o mundo, as situações,  e passamos a aceitar o sempre foi assim.

    Ainda lutamos com pedras nas mãos, enquanto há inúmeras armas de fogo, ou seja, somos carentes do básico: do ser.

      Entre o ovo ou a galinha, o ser ou o ter. Quem deveria vir primeiro é o ovo, sem dúvida. Todo o processo de formação que se tem dentro do ovo é que se fará uma boa galinha, é preciso, portanto, passar pelos crivos do ser para poder se saber lidar com o ter.

Mesmo quem tenha nascido com os privilégios do ter se não for incentivado a ser, poderá ser uma bomba em nossa sociedade. Gandhi diz que um dos pecados capitais é riqueza sem trabalho. Uma pequena análise sobre a vida do filho de um dos empresários mais ricos do Brasil que foi envolvido em um acidente de trânsito, vitimando fatalmente um rapaz, por exemplo, e podemos verificar toda a inconsequência de se ter tudo e se buscar nada...
Pedra Sutil

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